A reutilização do termo privatização aplicado ao sector cultural, com inúmeros exemplos na Europa e no mundo, não significa um total afastamento do Estado na gestão, sustentabilidade e valorização dos bens culturais. Existem múltiplas formas de relacionamento entre o Estado e o sector privado, tendo a cultura, incluindo a sua dimensão patrimonial, como objecto de gestão.
A privatização no âmbito do património cultural, segundo o célebre economista australiano Charles David Throsby, “deve ser entendida não apenas como mais um mercado a explorar, mas sobretudo como um incremento da autonomia face aos poderes públicos, solicitando mais respon-
sabilidade do mecenato”, ou seja, entendemos que a privatização pode constituir um processo de complementarização das acções do Estado.
Sabe-se que as mudanças dos novos padrões de consumo e de lazer da sociedade angolana, assim como os crescentes investimentos de empresas e instituições na cultura, têm contribuído para a ampliação e criação de um público e mercado para os produtos e eventos culturais. A dança, teatro e cinema, que deveriam estar mais próximos dos clássicos da literatura, através do mecenato e, sobretudo a música, têm crescido de forma inusitada, muitas vezes, ou quase sempre, sem o correspondente apoio infra-estrutural, ao nível dos equipamentos, a graça da componente de ensino e a cobertura da regulamentação jurídica.
Os riscos de divisão da sociedade, pelas assimetrias no acesso à cultura, e a sua vulnerabilidade às crescentes pressões de consumo dos produtos culturais vindos de fora, exigem que a promoção da cultura endógena, por processos criativos de privatização, seja fundamental para que os angolanos se desenvolvam livre, integral e solidariamente e afirmem os seus valores identitários no mundo.
No entanto, a ausência de estatísticas e a deficiente relação e distanciamento da cultura com o universo da contabilidade numérica, não têm facilitado a relação e integração da acção cultural nos grandes projectos económicos. A cultura tem de saber onde está e o que faz, procurando sempre encontrar uma definição objectiva e uma classificação numérica dos projectos, evitando os excessos descritivos.