Curiosamente é a nível dos órgãos públicos de comunicação onde os profissionais desta área têm dado cartada. Segundo os artistas, são vários os organismos do Estado e da sociedade civil que solicitam os seus serviços para campanhas publicitárias institucionais. A maioria dos artistas com quem falamos assume que é o Governo, na vertente de intervenção social, que mais solicita os serviços de cartoon e, essencialmente, banda desenhada.
Numa linguagem popular, quando as mensagens e os personagens apelam aos interesses destes órgãos, servem, mas quando colocam em causa ou provocam a reflexão sobre as acções governamentais, deixam de servir. Não é por acaso que o personagem "Tio André é Bufo” foi criado na época da luta contra o colonialismo, de forma a passar a mensagem do MPLA.
Mas apesar do reconhecimento, a 10 de Dezembro de 2020,do cartoonista Sérgio Piçarra como primeiro angolano, entre 15 personalidades internacionais, a beneficiar do Prémio Franco-Alemão dos Direitos Humanos e do Estado de Direito; e de Gildo Pimentel, em Maio do ano passado, receber a medalha de bronze no Prémio Internacional de Mangá, no Japão, pouco ou "quase” nada está a ser feito a nível interno para fortalecer e consolidar esse sector da arte.
Na ressaca do lançamento do livro "Golpe Baixo e Jogo Sujo” de Sérgio Piçarra, proporcionamos aos leitores uma viagem ao desconhecido mundo do cartoon e BD em Angola. Este trabalho tem como base conversas com alguns artistas mais novos e que estão no mercado. Nesta fase da "quase inexistência” da banda desenhada e do cartoon na imprensa pública, destaca-se Sérgio Piçarra na contramão, produzindo com regularidade em dois semanários privados (Novo Jornal e Expansão) e em dois portais (DW e IstoÉNotícia).
Como sempre, este será um dossier não acabado, onde começamos por apresentar duas perspectivas cronológicas do movimento da banda desenhada em Angola, e partilhamos os pontos de vista de alguns integrantes deste movimento. No futuro esperamos publicar perfis dos artistas, que desafiam os responsáveis de publicações como o Jornal de Angola, historicamente a vitrina do cartoon em Angola, a voltar a publicar banda desenhada. Este jornal foi o viveiro da geração de Sérgio Piçarra e Lito Silva e contribuiu para o surgimento de uma nova geração de cartoonistas.